★ Caminho.

Olhei o relógio. Tinham passado alguns minutos desde que o tinha olhado da ultima vez. Não sei para quê tanta insistência em olha-lo. Não tinha pressa, não estava atrasada, não estava esperando nada, nem tinha motivos para avançar ou parar no tempo. Acho que era puro vicio de quem não tem mais nada que fazer. A chuva miudinha, que caia com alguma frequência, estava a começar a tornar-se chata. Impedia-me de ver o caminho. A roupa estava húmida. Tinha as mãos nos bolsos. Estava algum frio. Eu ia para não sei onde, para fazer não sei o quê. Já não era a primeira vez que o fazia. Os pensamentos agitavam ligeiramente a minha mente. Não haviam atormentos, não haviam razões que os exaltassem ou estimulassem demasiado. Estava tudo demasiado calmo cá dentro. Tudo demasiado esclarecido. Não haviam razões para dúvidas ou dilemas ou incertezas. Estava tranquila. Estava feliz. Sim, estava feliz. Não que houvesse alguma razão particular para o estar, mas estava. E nisto surgiram imensas divagações, turbilhando e querendo interpelarem-se umas às outras. Fiz um stop e fui por partes... Acho que finalmente conseguia sentir-me completa. Completa e feliz. Tinha tudo aquilo que precisava para ser feliz e não para me sentir feliz ocasionalmente. Após as lutas constantes, os caminhos rochosos e esburacados, os atormentos e tantas coisas mais, eu tinha conseguido cumprir o meu objectivo. O meu maior objectivo. Provavelmente o único objectivo que tinha tido sempre em primeiro lugar no meu top da vida. Já tinham passado menos de 17 anos e finalmente consegui. E não, não é difícil. Mas cada um tem a sua maneira. Só cada um pode encontrar a sua felicidade, a sua formula mágica para ser feliz. E não, não foi fácil. Agora, depois de ter passado a fase da pesquisa e da resolução, agora que "cheguei ao fim" parece fácil e tão óbvio. Mas não é! Retirei de mim e do meu mundo todas as futilidades, limpei-o do que era desnecessário, dei valor aos minúsculos pormenores, libertei-me do que me amarrava ao chão e construi as minhas próprias asas, criei o meu mundo, o meu planeta e nele inseri as pessoas realmente importantes, os momentos realmente importantes.. E, o mais importante de tudo isso, inseri-me a mim. Sim, porque hoje eu consigo por-me no top das prioridades (coisa que nunca o tinha feito nem me tinha passado pela cabeça). Porque hoje eu sei que acima de tudo eu tenho de estar no topo de mim mesma. Se não o estiver, mais ninguém estará... Hoje sei de tudo isso e hoje sei de mim. Sei que me conheço e sei que tenho certezas absolutas de mim. Sei que sou feliz porque a felicidade não é algo que aparece, mas sim algo que se constrói. Não é aquilo que queremos, é aquilo que fazemos.
Com as divagações arrumadas e de volta ao silêncio de mim mesma, continuei o caminho para não sei onde, para fazer não sei o quê e voltar não sei quando. Porque a vida é o caminho que temos de seguir para saber o lugar para onde vamos e onde chegamos.